O sentimento de deixar tudo o que você construiu para trás – Meu intercâmbio em Dublin

O grande dia chegou. Tudo pronto para embarcar. Mas é isso mesmo? Duvido alguém ter tanta certeza para não pensar em voltar atrás quando vê sua mãe e pai chorando, todos os familiares te olhando como se nunca mais fossem te ver, se você estivesse partindo para algo sem volta. Não sei se todos os casos são assim, mas hoje penso que no fundo do coração, todos sabiam que eu não voltaria, que depois que as portas do mundo se abrissem eu não conseguiria mais viver no interior de Goiás. Hoje eu penso que no fundo do meu coração eu também sabia, mas deixar minha irmã grávida, minha mãe chorando, e meu pai (que não demonstra sentimentos) me pedindo para ficar, para trás não foi fácil. E por muitos dias eu pensei em ficar. Mas estaria ficando por eles e não por mim, porque o que eu queria mesmo era desbravar o mundo e isso não seria possível se eu continuasse ali vivendo vidas que não eram as minhas.

Lembro como se fosse hoje que vários amigos não quiseram ir comigo até a rodoviária, acredito que a imagem de ver alguém que a gente ama embarcando para longe não é fácil, despedidas em geral nunca são. Lá só estavam a minha irmã e meu ex namorado. Acho que eles estavam lá apenas para tentar me convencer de desistir dessa loucura até o último momento. Mas não conseguiram. Não foi fácil deixá-los.

Nas minhas primeiras semanas em Dublin, reavaliei a minha decisão inúmeras vezes, mas com o tempo minha mãe parou de chorar, minha nova vida começou a tomar forma, minha irmã teve minha sobrinha e eu percebi que ela não precisava de mim tanto quanto eu pensava, na verdade, nenhum deles precisava, a vida de todo mundo seguiu, inclusive a minha. Dói, mas ninguém é insubstituível, você sofre, mas logo se cura. Isso serve para o seu sofrimento e para o sofrimento que você causa.

Na medida que tudo foi dando certo, eles começaram a ficar felizes por mim, e ver que eles também estavam seguindo de lá também me fazia feliz. É engraçado, mas hoje posso dizer com toda certeza que tenho uma relação mais próxima dos meus pais que antes, quando morando a 20 minutos de distância. Então não fique pensando só na saudade e no quanto irá sofrer, pense no quanto essa experiência irá mudar o jeito como você enxerga sua família e seus amigos, e no valor que isso irá agregar, além de mostrar quem realmente quer seu bem e vai ficar do seu lado não importa a decisão que você tome.

Além de pessoas também deixamos bens materiais e uma falsa ilusão de estabilidade, é difícil opinar sobre isso, porque cada pessoa tem suas verdades e sua própria história, mas sob o meu ponto de vista, um apartamento financiado por 25 anos e um carro que acabou de ser quitado e já vale menos da metade do que você pagou, não podem ser motivos para pensar que a vida esta boa e levar com a barriga. Um emprego sem perspectiva de crescimento, um país em crise, um salário onde probabilidade de reduzir é maior que a de aumentar, também não.

E esse foi só um post sentimental patrocinado pelo meu coração de manteiga derretida, que pensa que muito mais importante que as dicas das coisas palpáveis, são as dicas sobre o intangível, o imprevisível, aquilo que poder colocar tudo a perder se não for controlado, o mix de sentimentos inexplicáveis que talvez possa ser amenizado escutando de alguém que já passou pela mesma situação e sobreviveu.